Parcelamento do solo urbano
A Lei nº 6.766, de 19 de dezembro de 1.979 (Lei de Parcelamento do Solo Urbano), foi publicada em 20 de dezembro de 1.979 e é o instrumento legal que dispõe sobre o parcelamento do solo para fins urbanos. Também era chamada de Lei Lehmann, pois o projeto de lei que deu origem a ela foi apresentado em 1.977 pelo então Senador Otto Cyrillo Lehmann[1].
Antes dessa nova lei, os parcelamentos para fins urbanos eram regidos pelo Decreto-lei nº 58, de 10 de dezembro de 1.937, regulamentado pelo Decreto nº 3.079, de 15 de setembro de 1.938. O Decreto-lei nº 271, de 28 de fevereiro de 1.967 também estabelecia normas sobre os loteamentos urbanos.
O parcelamento do solo para fins rurais, destinados a implantação de atividades agrícolas, pastoris ou extrativistas não são regidos pela Lei nº 6.766/79 e sim pelo Estatuto da Terra (Lei nº 4.504/64), sendo de responsabilidade do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA, a disciplina do procedimento de licenciamento dos parcelamentos com fins rurais.
Breve histórico sobre a legislação de parcelamento do solo no Brasil
Para contextualizar a história do parcelamento do solo urbano no Brasil é preciso observar os efeitos da Revolução Industrial.
Nos anos de 1930, esse processo de industrialização se acentua no Brasil, provocado pela crise no mercado cafeeiro, com a quebra da Bolsa de Valores de New York, em 1929, conhecida como a Grande Depressão, resultando no maior período de recessão econômica da história dos Estados Unidos, terminando no final da década de 1930 com a Segunda Guerra Municipal. Acontece que os Estados Unidos eram o principal comprador do café brasileiro. Sem comprador, sem ter para que vender o café, o governo brasileiro comprou e queimou toneladas de café, endividando-se, para manter a oferta e o preço do produto brasileiro. A região sudeste do Brasil, durante décadas, movimentou a economia do país pelo comércio de café. O impacto do crash da bolsa novaiorquina foi enorme na economia do Brasil. Nesta época, sem uma diretriz nacional de desenvolvimento ou recuperação, alguns cafeicultores investiram na instalação de indústrias. Dava-se início, a um dos fatores que resultou na migração da população da zona rural para o perímetro urbano e zonas de expansão urbana das cidades.
Os efeitos do crash deram origem ao chamado “êxodo rural” que aconteceu em todo o país, em certas regiões e em épocas diferentes, tal como a crise da cana-de-açúcar e da borracha, e a migração nordestina para São Paulo e Rio de Janeiro, em meados do século XX, especialmente nas décadas de 60 e 70.
A quebra da bolsa foi um fator importante para a migração dos moradores da zona rural para as cidades, mas não foi o único. As cidades oferecem melhores condições de trabalho, habitação, saúde, ensino, saneamento básico, recreação e lazer. Segundo Edward L. Glaeser, Professor de economia da Universidade de Harvard, os centros urbanos (cidades) são as maiores invenções da humanidade.
Relatou na década de 1940, o notável Waldemar Martins Ferreira, que “o afluxo, que ultimamente se há verificado, quase que em todo o mundo, das populações rurais para os centros urbanos, aumentando, às vezes imprevistamente, as necessidades da coabitação, trouxe como consequência natural o descongestionamento, provocado pelas empresas que, aqui como acolá, entraram a explorar a indústria dos loteamentos de terrenos, nos arrabaldes ou subúrbios. Criou-se essa indústria diante da impossibilidade dos poderes públicos municipais de enfrentarem o problema e darem-lhe a solução adequada e até premente. No começo, tudo correu desordenadamente, de acordo com o capricho ou com as conveniências dos loteadores profissionais, mais preocupados. com o seu interesse de lucro do que com o atendimento das condições de higiene ou de estética, quando não das econômicas e sociais, que confluem para a complexidade do aspecto urbanístico. Tudo isso, como é de imaginar, exigiu a interferência do poder público, a bem da coletividade, e o estabelecimento de normas gerais a que os loteamentos se subordinariam, sob a égide da lei”.
Por isso que diz Pontes de Miranda que os juristas do passado foram desatentos à juridicização dos parcelamentos. O que importa era a venda da parte como res, portando o esquecimento de todo o passado da coisa.
Waldemar Martins Ferreira, em citação ao trabalho de William Qualid, professor da Faculdade de Direito de Paris, doutrinou que “todo ato individual em matéria de serviço urbano é prenhe de consequências para a coletividade. Deve esta, por isso mesmo, estar atenta no prevenir os males de iniciativa inconsiderada e unicamente guiada pelo ânimo de lucro. Deve ela recorrer a vários meios, quer os autoritários e regulamentares, quer os persuasivos. Como autoridade administrativa, tem ela poderes para obrigar os particulares à observância de certas regras: alinhamento, largura das ruas, espaços livres, ensolamento, orientação dos imóveis, etc. Como autoridade econômica, representando os interesses coletivos, pôde ela e deve usar de sua faculdade de intervir, ajudando financeiramente as empresas ou serviços de natureza econômica, mercantil ou industrial. Torna-se a autoridade pública, dessarte, associada aos interesses privados. Deixa ela a estes a iniciativa, os riscos, parte do lucro, mas, ao mesmo tempo, impede que se tornem, por degenerescência, em motores únicos da atividade, desconhecendo o interesse geral. Este há de estar sempre presente no espírito e no programa de quantos, usurpando atribuições que deveriam ser sempre, e necessariamente, do âmbito do poder público, tomam sobre si a responsabilidade de empreendimentos em que prima o interesse da coletividade. Eis porque, na França, como na Alemanha, e em outros países, leis se promulgaram, de molde a disciplinar a atividade das indústrias de loteamentos de terrenos urbanos”.
Durante mais de 300 anos vigorou no Brasil as “Ordenações Filipinas”[2], somente revogadas em 1916, pelo Código Civil. O livro IV, Título IX, trazia disposições sobre a alienação com recebimento a prazo pelo vendedor, prevendo, entretanto, o direito de arrependimento, que seria mantido pelas futuras legislações até o advento da Lei nº 6.766/79. O artigo 1.088, do antigo Código Civil de 1916, estabelecia que “quando o instrumento público for exigido como prova do contrato, qualquer das partes pode arrepender-se, antes de o assinar, ressarcindo à outra as perdas e danos resultantes do arrependimento”. Isso dava margem para práticas fraudulentas dos loteadores, em prejuízo a boa-fé que deve pautar os negócios jurídicos e ao que conhecemos hoje como direitos do consumidor.
O vendedor do lote celebrava um contrato preliminar com o adquirente do lote. O pagamento era realizado em prestações. O vendedor usava dos recursos obtidos com as prestações pagas para executar a infraestrutura urbana e demais melhoramentos. Quando ocorria a valorização do terreno, ele optava pelo “arrependimento”, devolvia as prestações pagas e revendia o lote à terceiros em valores superiores aos estabelecidos nos contratos preliminares. A solução, basicamente, seria retirar desses contratos o efeito do “arrependimento”.
Em 1936 foi apresentado à Câmara dos Deputados projeto de lei sobre venda e compra de imóveis a prestações; o autor, o ilustre Waldemar Martins Ferreira, abalizava os males da falta de legislação especial, alguns devidos à desonestidade de empresas loteadoras, precariedade dos títulos dos vendedores, gravame dos terrenos, deficiência da segurança jurídica baseada no Código Civil. Segundo Pontes de Miranda, o intuito do projeto de Waldemar Martins Ferreira seria proporcionar aos compradores de terras e terrenos a certeza, ainda assim relativa, de, cumpridas todas as obrigações por eles assumidas, adquirem a propriedade delas, por via judicial e mercê de adjudicação.
O projeto de Waldemar Martins Ferreira resultou no Decreto-lei nº 58, de 10 de dezembro de 1937.
Acontece que essa norma ainda se apresentava como insuficiente, pois cuidou apenas dos aspectos de Direito Privado, regulando, especialmente, as relações contratuais entre vendedor e adquirente do lote. Era preciso uma legislação que cuidasse da urbanização do loteamento, as responsabilidades administrativas, civis e criminais.
Houve uma regulamentação ao Decreto-lei nº 58/37, através do Decreto nº 3079/38, que em nada mudou a sistemática jurídica já estabelecida pelo decreto-lei.
No propósito de estabelecer critérios urbanísticos nesses empreendimentos que surgiam e se espalhavam por várias regiões do país, foi editado o Decreto-lei nº 271, 28 de fevereiro de 1967, que timidamente estabeleceu que nos loteamentos seria exigida a infraestrutura e que desde a data da inscrição do loteamento passariam a integrar o domínio público do Município as vias e praças e as áreas destinadas a edifícios públicos e outros equipamentos urbanos, constantes do projeto e do memorial descritivo.
Era preciso uma legislação mais ampla sobre o assunto. A Lei nº 6.766, de 19 de dezembro de 1979 (Lei de Parcelamento do Solo Urbano), publicada em 20 de dezembro de 1979 é o instrumento legal que dispõe sobre o parcelamento do solo para fins urbanos. Também era chamada de Lei Lehmann, pois o projeto de lei que deu origem a ela foi apresentado em 1977 pelo então Senador Otto Cyrillo Lehmann.
A principal modificação imposta ao ordenamento jurídico foi estabelecer os requisitos do projeto de loteamento, disposições sobre a competência municipal para aprovação, registro, contratos e os crimes.
Diversas leis realizaram alterações na Lei nº 6.766/79, tal como a Política Nacional de Proteção e Defesa Civil (Lei nº 12.608/12), que proíbe parcelamento do solo em áreas de risco, e a Lei de Regularização Fundiária (Lei nº 13.465/17), que institui o “loteamento de acesso controlado” e estabelece normas sobre os “condomínios de lotes”. Mais recentemente, foi alterada a norma sobre “áreas não edificáveis” às margens das rodovias (Lei nº 13.913/19) e para prever a prorrogação do cronograma para execução das obras de infraestrutura (Lei nº 14.118/21).
Todavia, a lei que realmente produziu uma profunda modificação na Lei nº 6.766/79, foi a Lei nº 9.785/99, editada com o escopo de estabelecer normas de caráter social na política de parcelamento do solo urbano. Definiu a infraestrutura básica obrigatória para os loteamentos e desmembramentos, convencionais ou de interesse social. Alterou o artigo que estabelecia o percentual de 35% de áreas públicas, para deixar que esse padrão seja definido por lei municipal. Certamente, a mudança mais importante ocorreu com a inclusão do §6º, no artigo 26, da Lei nº 6.766/79, tornando o “compromisso de compra e venda, cessão ou promessa de cessão” uma nova figura jurídica que pode ser levada a registro com a prova de quitação da obrigação, independentemente de prévia manifestação do vendedor do lote ou do Poder Judiciário, dispensando, ainda, a escritura pública para qualquer valor de lote. Antes, se o vendedor do lote recusasse firmar o contrato definitivo ou escritura definitiva, seria necessário requerer judicialmente a “adjudicação compulsória”.
Parcelamento para fins urbanos
A Lei nº 6.766/79 somente é aplicável no âmbito dos parcelamentos do solo para finalidades urbanas: moradia, comércio, serviços, indústria, institucional, recreação e lazer. Qualquer uma dessas atividades, de modo exclusivo, ou por meio de uso misto, são regidas pela Lei nº 6.766/79, que estabelece as “normas gerais”, algumas diretrizes específicas e padrões a serem exigidos na aprovação de loteamentos e desmembramentos.
Competência para legislar sobre parcelamento do solo
Observando-se a competência constitucional dos Municípios para dispor sobre o uso e ocupação do solo, poderá editar normas relacionadas ao parcelamento do solo urbano, desde que não entrem em conflito com as normas de caráter obrigatório previstas na legislação federal e estadual.
O artigo 24, I, da Constituição Federal, estabelece que é competência concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal “legislar” sobre “Direito Urbanístico”. No âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais. A competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados. Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades. A superveniência de lei federal sobre normas gerais suspende a eficácia da lei estadual, no que lhe for contrário.
Aos Municípios compete “legislar” sobre assuntos de “interesse local” e suplementar a legislação federal e a estadual no que couber (art. 30, I e II, da Constituição Federal). Nesse sentido, a Lei nº 6.766/79, no artigo 1º, parágrafo único, estabeleceu que os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão estabelecer normas complementares relativas ao parcelamento do solo municipal para adequar o previsto na Lei nº 6.766/79 às peculiaridades regionais e locais.
A Lei nº 6.766/79 não é autoaplicável. O artigo 3º, caput, estabelece que depende de lei municipal estabelecer a zona urbana (perímetro urbano), zona de expansão urbana e zona de urbanização específica. O artigo 4º, §1º, dispõe que lei municipal estabelecerá os padrões urbanísticos (percentual de áreas públicas). O artigo 8º autoriza dispensar por lei municipal a fase de diretrizes para o Município com menos de 50.000 habitantes e para o Município que possuir plano diretor com diretrizes de urbanização. Segundo o artigo 16, lei municipal definirá os prazos para aprovação do projeto e aceitação das obras de urbanização. O artigo 18, V, prevê que a infraestrutura mínima deverá ser prevista em lei municipal, respeitada a infraestrutura básica que o legislador definiu no artigo 2º.
O artigo 15, da Lei nº 6.766/79, dispõe que os Estados estabelecerão, por decreto, as normas a que deverão submeter-se os projetos de loteamento e desmembramento nas áreas previstas no artigo 13 da Lei nº 6.766/79, observadas suas disposições. Pelo parágrafo único do mesmo artigo, na regulamentação dessas normas o Estado procurará atender às exigências urbanísticas do planejamento municipal.
O artigo 49, da Lei nº 10.257/01 (Estatuto da Cidade) estabelece que os Municípios devem “fixar prazos, por lei, para a expedição de diretrizes de empreendimentos urbanísticos, aprovação de projetos de parcelamento e de edificação, realização de vistorias e expedição de termo de verificação e conclusão de obras”. E, enquanto não fixarem o prazo, fica valendo o prazo de 60 (sessenta) dias.
A Lei nº 10.257/01 (Estatuto da Cidade), em seu artigo 2º, estabelece que a política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, mediante as algumas diretrizes gerais, dentre as quais, a ordenação e controle do uso do solo, de forma a evitar “o parcelamento do solo, a edificação ou o uso excessivos ou inadequados em relação à infraestrutura urbana” e “a instalação de empreendimentos ou atividades que possam funcionar como pólos geradores de tráfego, sem a previsão da infraestrutura correspondente”.
O plano diretor dos Municípios incluídos no cadastro nacional de municípios com áreas suscetíveis à ocorrência de deslizamentos de grande impacto, inundações bruscas ou processos geológicos ou hidrológicos correlatos deverá conter “parâmetros de parcelamento, uso e ocupação do solo, de modo a promover a diversidade de usos e a contribuir para a geração de emprego e renda” (art. 42-A, I, Lei nº 10.257/01).
Os Municípios que pretendam ampliar o seu perímetro urbano deverão elaborar projeto específico que contenha, no mínimo, entre outros requisitos, a “definição de parâmetros de parcelamento, uso e ocupação do solo, de modo a promover a diversidade de usos e contribuir para a geração de emprego e renda” (art. 42-B, IV, Lei nº 10.257/01).
Além disso, é competência privativa dos Municípios “promover adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano”, legislando sobre temas de interesse local e complementado a legislação federal e estadual, conforme previsto no artigo 30, incisos I, II e VIII, da Constituição Federal:
Art. 30. Compete aos Municípios:
I – legislar sobre assuntos de interesse local;
II – suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;
VIII – promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano;
No exercício de sua competência para legislar, deve o Município adotar como diretriz a “simplificação da legislação de parcelamento, uso e ocupação do solo e das normas edilícias, com vistas a permitir a redução dos custos e o aumento da oferta dos lotes e unidades habitacionais” (art. 2º, XV, Lei nº 10.257/01). Sabemos que o parcelamento do solo pode ser realizado através de diferentes modalidades (loteamento, desmembramento, condomínio de casas ou de lotes, loteamento de acesso controlado, desdobro, sítio de recreio, núcleo comercial ou industrial). Não deve o gestor público fazer uma lei para cada um deles. Simplificar significa adotar requisitos e procedimentos semelhantes, sem introduzir no texto legal a repetição desnecessária de normas técnicas de engenharia.
Na elaboração da legislação urbanística, deve o Município garantir a gestão democrática da cidade devendo se utilizar da realização de audiências e consultas públicas (art. 43, II, Lei nº 10.257/01).
Desse modo, são três importantes princípios que devem ser observador na elaboração da legislação urbanística municipal: a) a competência para legislar sobre assuntos de interesse local, suplementando a legislação federal e estadual no que couber, para o adequado ordenamento territorial, planejamento e controle do uso, ocupação e parcelamento do solo urbano; b) a simplificação da legislação; c) a participação popular na discussão do projeto de lei.
Definição de empreendedor
Segundo o artigo 2º-A, incluído pelo “Programa Casa Verde e Amarela” (Lei nº 14.118/21), considera-se empreendedor, para fins de parcelamento do solo urbano, o responsável pela implantação do parcelamento, o qual, além daqueles indicados em regulamento, poderá ser: a) o proprietário do imóvel a ser parcelado; b) o compromissário comprador, cessionário ou promitente cessionário, ou o foreiro, desde que o proprietário expresse sua anuência em relação ao empreendimento e sub-rogue-se nas obrigações do compromissário comprador, cessionário ou promitente cessionário, ou do foreiro, em caso de extinção do contrato; c) o ente da administração pública direta ou indireta habilitado a promover a desapropriação com a finalidade de implantação de parcelamento habitacional ou de realização de regularização fundiária de interesse social, desde que tenha ocorrido a regular imissão na posse; d) a pessoa física ou jurídica contratada pelo proprietário do imóvel a ser parcelado ou pelo poder público para executar o parcelamento ou a regularização fundiária, em forma de parceria, sob regime de obrigação solidária, devendo o contrato ser averbado na matrícula do imóvel no competente registro de imóveis; e) a cooperativa habitacional ou associação de moradores, quando autorizada pelo titular do domínio, ou associação de proprietários ou compradores que assuma a responsabilidade pela implantação do parcelamento.
Neste caso, não há inovação alguma do legislador. O proprietário do terreno sempre teve legitimidade para requerer a aprovação e o registro do parcelamento do solo, pois reúne os atributos da propriedade (usar, gozar, dispor e reaver a coisa). Está justamente no atributo de “dispor” da coisa (art. 1228, Código Civil) que o proprietário é legítimo para implantar um loteamento ou desmembramento e promover a alienação dos lotes, com sua regular transferência perante o registro de imóveis.
Os demais legitimados pelo artigo 2º-A, da Lei nº 6.766/79 não detém, por si só, o atributo de “dispor” da coisa, isto é, alienar os lotes e destinar as áreas públicas, razão pela qual sempre será exigível um instrumento que comprove a autorização ou anuência do proprietário do imóvel com as medidas de aprovação e registro do parcelamento.
Definição de parcelamento do solo urbano
Nem todas as divisões do terreno estarão sujeitas a aplicação das normas da Lei nº 6.766/79. A lei apenas previu duas formas de parcelamento do solo: o loteamento e o desmembramento. Em relação aos “condomínios de casas” e “condomínios de lotes”, quando caracterizados como parcelamento do solo, a Lei nº 6.766/79 também deve ser aplicada, juntamente com a Lei nº 4.591/64 e o capítulo sobre condomínio do Código Civil.
Os desdobros, no entanto, não estão previstos na Lei nº 6.766/79, razão pela qual ela não se aplica aos desdobros, exceto em relação ao artigo 3º e ao inciso II, do artigo 4º, da Lei nº 6.766/79, conforme jurisprudência assentada no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo a respeito do tema:
AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER – pedido de desdobro. Distinção entre as demais formas de parcelamento de solo urbano reguladas pela Lei 6.766/79, quais sejam, loteamento e desmembramento. Estas referem-se à subdivisão da gleba enquanto o desdobro é a subdivisão do lote. Embora regulado por Lei Municipal, o desdobro deve obedecer aos requisitos mínimos dos arts. 3º, parágrafo único, e 4º, II, da Lei 6.766/1979. Jurisprudência sedimentada. Trata-se de terreno com área total bem inferior a 125 m², razão pela qual torna-se impossível o registro do imóvel no Cartório Extrajudicial competente. Impossibilidade de reconhecimento da usucapião especial urbana, nos termos do art. 183, da Constituição Federal de 1988, caso contrário, estar-se-ia burlando a Lei de Parcelamento de Solo Urbano e se reconhecendo direito inexistente. Direito de moradia assegurado com a posse do imóvel. Reforma da r. sentença de primeiro grau. Recurso Provido. (Relator(a): José Luiz Germano; Comarca: Ribeirão Preto; Órgão julgador: 2ª Câmara de Direito Público; Data do julgamento: 28/06/2011; Data de registro: 28/06/2011)
Dois elementos são necessários para caracterizar um parcelamento urbano do solo regido pela Lei nº 6.766/79, ou seja, para que tenhamos uma divisão dentro de um terreno e esta divisão seja considerada como loteamento ou desmembramento, a configuração simultânea de dois requisitos é fundamental para isso: a) que o terreno objeto da divisão seja área definida como gleba; e b) que a divisão do terreno (isto é, da gleba) em lotes seja destinada a edificação para formação de um núcleo urbano.
A exigência desses dois elementos está inserida na conceituação de loteamento e desmembramento, cujas definições estão previstas no artigo 2º, §1º e §2º, da Lei nº 6.766/79. Tanto o loteamento como o desmembramento são definidos como a subdivisão de gleba em lotes destinados a edificação.
Gleba
Explica Diógenes Gasparini que o loteamento pressupõe a existência de uma gleba. O conceito de gleba não foi definido originariamente na Lei nº 6.766/79, mas houve um projeto de lei que deu origem a Lei nº 9.785/99, incluindo o §3º, no artigo 2º, da Lei nº 6.766/79, para estabelecer o conceito de “gleba”, mas foi vetado, e segundo as Razões do Veto, a norma define gleba como sendo “o terreno que não foi objeto de parcelamento aprovado ou regularização em cartório”. Em assim sendo, todo o terreno que tenha sido objeto de parcelamento deixa de ser gleba, passando a ser lote. Essa conceituação, ainda segundo as Razões do Veto, permitiria a prática do desdobro sucessivo de lotes, beneficiando, assim, apenas os loteadores, que, por não contemplar a Lei nº 6.766/79, a figura do desdobro, ficarão desobrigados de atender às exigências por ela impostas, sob o argumento de que esse diploma legal só se aplica à subdivisão de glebas em lotes e não a desdobro de lotes. Finaliza as Razões do Veto que, tendo em vista que compete ao Município, por força do artigo 30, VIII, da Constituição Federal, o planejamento do parcelamento do solo urbano, com o fim de promover o adequado ordenamento territorial, melhor seria que não se aceitasse o § 3º proposto, até mesmo porque, o § 4ª sugerido, ao definir lote, indiretamente define gleba, uma vez que os conceitos são complementares.
Da mesma forma pensa o Diógenes Gasparini, segundo o qual a lei municipal poderá ante essa problemática de ausência de definição em lei federal do conceito de gleba, definir o que seja gleba para fins de parcelamento urbano, já que ao Município cabe expedir ou editar normas complementares e de adequação. Para alguns profissionais do Direito gleba deverá ser definida pelo tamanho da área, ou seja, considerar-se-ia gleba os terrenos com área igual ou superior a 20.000 m². O Diógenes Gasparini considera gleba toda área em que se pode, nos termos da lei, implantar um loteamento ou desmembramento para fins urbanos[3].
No Estado de São Paulo, as Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça, do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, estabelecem no item 170.5 que o registro especial previsto no artigo 18, da Lei nº 6.766/79 não será exigido quando o desmembramento resultar em até 10 lotes ou que resulte entre 11 e 20 lotes, mas neste último caso que seja servido por rede de água, esgoto, guias, sarjetas, energia e iluminação pública. Esse é um critério que pode ser utilizado pelos Municípios para definição da gleba, isto é, pelo número de lotes, somente sendo considerada uma gleba quando a área for dividida em mais de 10 lotes, ou entre 11 e 20 lotes (servido por rede de água, esgoto, guias, sarjetas, energia e iluminação pública). Tudo aquilo abaixo desse número de lotes não é considerado gleba e, portanto, não é considerado um parcelamento do solo regido pela Lei nº 6.766/79 (loteamento ou desmembramento).
A definição do que é gleba, tal como fez São Paulo, pode estar associada ao número de lotes. Por exemplo, poderá um determinado Município estabelecer que todo parcelamento e um terreno em até 10 lotes, respeitando a área mínima do lote, não é gleba. Ao contrário, os parcelamentos acima de 10 lotes são considerados como gleba.
Temos, portanto, na definição do conceito de gleba, algumas alternativas: a) pode o Município fixar o conceito de gleba pelo tamanho do terreno; b) pode o Município fixar o conceito de gleba pelo número de lotes. Tanto em um como em outro caso deve o Município observar as normas da Corregedoria Geral de Justiça do seu Estado para assegurar compatibilidade destas normas com a legislação municipal.
Fins de edificação
Como dissemos, para caracterizar um loteamento ou desmembramento são necessários dois elementos, que o projeto ocupe uma gleba e que tenha fins de edificação para formação de um núcleo urbano de residências, comércios, indústrias, serviços.
Precisa ter fins de edificação e formação de núcleo populacional urbano (residências, comércio, indústrias, área de lazer). Muitas vezes, pode acontecer da divisão do terreno ser decorrente da partilha de bens em inventário entre os herdeiros, pode ser decorrente da liquidação judicial de parte do terreno para pagamento de dívidas, ou pode ser a divisão do terreno para desconstituir um condomínio. Nestes exemplos, a divisão do terreno não se destina para fins de edificação e formação de núcleo populacional urbano, ou seja, não possui os elementos fundamentais para caracterizá-los com loteamento ou desmembramento, motivo pelo qual, não estão sujeitos ao registro especial da Lei nº 6.766/79, independentemente do tamanho da área. Quando não há a intensão de edificar e formar núcleo populacional urbano, o que temos na verdade são outras formas de retalhamento do solo urbano, não contemplados pela Lei nº 6.766/79 com normas específicas, ficando a cargo dos Municípios definir os requisitos e o procedimento para o licenciamento urbanístico.
(…) Os autos retratam parcelamento para sítios de lazer distante da área urbana, com poucos lotes e apenas uma via interna de acesso de uso privativo. É situação que não se amolda à estrutura da LF nº 6.766/79, que cuida de parcelamentos inseridos na área urbana ou que se destinam a formar núcleos urbanos de alguma expressão a justificar a reserva de áreas institucionais, de áreas verdes e a doação de ruas; essa regularização implica na transferência ao município do ônus da manutenção das ruas e das áreas públicas e pode não atender ao interesse da administração ou à expectativa dos adquirentes, que preferem conservar privativas essas pequenas áreas. Mas, ainda que se rejeite a informalidade do parcelamento e a necessidade de regularização, não me parece que a LF nº 6.766/79 seja a única e a melhor solução. A lei tem em vista o parcelamento de maior dimensão em zona urbana, envolvendo problemas urbanísticos e proteção aos adquirentes; exige do loteador a doação das ruas, das áreas verdes e das áreas institucionais prevendo o adensamento urbano e populacional (daí a necessidade de praças, escolas, postos de saúde, um sistema viário adequado, etc) e impõe à administração o ônus de manter e conservar as áreas doadas. Assim, a regularização impõe um ônus ao loteador e também à administração; não é adequada à situação dos autos, de um pequeno núcleo de 21 lotes, sete ou oito moradias e uma área fechada por uma porteira a 15 km da zona urbana; e não atende aos moradores, pois a doação da rua implica em mantê-la pública e admitir o acesso de pessoas indeterminadas, reduzindo a segurança e o sossego dos adquirentes. A inadequação da LF nº 6.766/79 e da sentença salta aos olhos: manda os réus (loteador e Prefeitura) providenciar a infraestrutura de água, luz e esgoto, quando a distância e a pequena dimensão fazem pressupor um custo de todo desproporcional ao problema; água e esgoto não é responsabilidade da Prefeitura, mas da SABESP que não vai estender o serviço a essas poucas casas, e a luz é responsabilidade da concessionária, que segue seu plano próprio de investimento e infraestrutura. Disso decorre (a) a necessidade de regularização; (b) a inadequação do parcelamento previsto na LF nº 6.766/79; e (c) a necessidade de uma terceira via, que só pode ser o condomínio horizontal da LF nº 4.591/64, opção aberta aos interessados. (Relator(a): Torres de Carvalho; Comarca: São José do Rio Preto; Órgão julgador: 1ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente; Data do julgamento: 05/02/2015; Data de registro: 25/02/2015; Outros números: 4681384800)
Modalidades de parcelamento do solo urbano
O parcelamento do solo pode ser dividido e classificado em algumas modalidades:
a) os “loteamentos”, constituídos na forma da Lei nº 6.766/79, dividem a gleba em lotes, com abertura de novas ruas públicas ou o prolongamento das existentes;
b) os “desmembramentos”, também constituídos na forma da Lei nº 6.766/79, dividem a gleba em lotes, mas todos os lotes devem ter frente para um sistema viário público já existente;
c) os “desdobros” ou “fracionamentos”, na hipótese de divisão do lote, em que não se configura o parcelamento do solo previsto na Lei nº 6.766/79;
d) os “loteamentos de acesso controlado”, são os loteamentos aprovados nos termos da Lei nº 6.766/79, com autorização para a instalação de guarita, portaria e a concessão de uso das áreas públicas a associação de moradores;
e) os “condomínios de casas”, previstos no artigo 8º, da Lei nº 4.591/64, os quais caracterizam-se pela comercialização de lotes com casas construídas ou com promessa de construção, e com um sistema viário interno composto de ruas de propriedade comum dos condôminos;
f) os “condomínios de lotes”, previstos no artigo 1.358-A, do Código Civil, recentemente instituídos pelo legislador, e que caracterizam-se pela comercialização dos lotes, mediante incorporação imobiliária, para formação de condomínio nos termos da Lei nº 4.591/64, onde as futuras edificações serão erguidas pelos próprios adquirentes dos lotes, e com um sistema viário interno formado por ruas de propriedade comum dos condôminos;
g) os “sítios de recreio” ou “chácaras de recreio”;
h) os “parcelamentos do solo de interesse público”;
i) os “parcelamentos do solo de interesse social”;
j) os “núcleos industriais” e “distritos industriais”.
Loteamento
É a subdivisão de gleba em lotes destinados a edificação, com abertura de novas vias de circulação, de logradouros públicos ou prolongamento, modificação ou ampliação das vias existentes. É o loteamento “comum” ou “convencional”.
Desmembramento
É a subdivisão de gleba em lotes destinados a edificação, com aproveitamento do sistema viário existente, desde que não implique na abertura de novas vias e logradouros públicos, nem no prolongamento, modificação ou ampliação dos já existentes.
Desdobro
É a subdivisão do lote, desde que não implique na abertura de novas vias e logradouros públicos, nem no prolongamento, modificação ou ampliação dos já existentes e respeitados os critérios estabelecidos em legislação municipal e nas normas de serviço da Corregedoria Geral de Justiça dos Estados.
Loteamento de acesso controlado
É o loteamento convencional, com arruamento de domínio público, mas com acesso controlado aos moradores e demais visitantes.
Condomínio de lotes
É a subdivisão da gleba em lotes, formando um arruamento interno de domínio particular dos condôminos.
Condomínio de casas
É a subdivisão da gleba em lotes com a construção ou promessa de construção de casas térreas ou sobrados pelo empreendedor, formando um arruamento interno de domínio particular dos condôminos.
Sítio de recreio ou chácara de recreio
É a subdivisão da gleba em lotes, sob a forma de loteamento, desmembramento ou condomínio, geralmente destinado a moradia eventual ou de recreação e lazer dos proprietários.
Parcelamento do solo de interesse público
É o loteamento ou desmembramento implantado por iniciativa do Poder Público.
Parcelamento do solo de interesse social
É o loteamento ou desmembramento implantado por iniciativa do Poder Público ou de pessoa de direito privado, destinado a população de baixa renda.
Núcleo industrial e distrito industrial
Núcleo industrial pode ser constituído sob a forma de loteamento, desmembramento ou condomínio, com uso destinado a instalação de indústrias e empresas de logística. O distrito industrial é plano de urbanização de autoria do Poder Público, aprovado por lei.
Empreendimento implantado em fraude à Lei nº 6.766/79
Existem alguns empreendimentos que são implantados como se fossem prestadores de serviços de recreação, lazer, hotelaria, mas que na verdade constituem verdadeiro parcelamento do solo urbano, com divisão do terreno em lotes e arruamento interno. Isso é comum de se observar nos negócios que se apresentam como clube de lazer, associação ou condomínio em multipropriedade.
Clube de lazer
O clube de lazer, muitas vezes, acaba sendo também denominado de sítio de recreio, chácara de recreio, clube de recreio. No entanto, distingue-se do sítio de recreio ou da chácara de recreio, pois nestas o empreendedor aliena o lote ou a casa, em regime de loteamento, desmembramento ou condomínio. Já no clube de lazer, o empreendedor abre uma empresa destinada a funcionar como clube de lazer ou recreação, com piscinas, quadras poliesportivas, campings, marinas. E o empreendedor vende o “título de sócio”, que dá direito a determinada unidade imobiliária, individualizada e numerada, além da participação das áreas comuns.
É ilegal, evidente, pois nada mais é do que um condomínio de lotes ou de casas, dependendo de como for empreendido, mascarado como uma empresa de lazer e recreação, como meio de afastar o cumprimento da Lei nº 6.766/79 e da legislação urbanística municipal sobre parcelamento do solo.
Na mesma linha de interpretação, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul condena a instalação dos denominados “clubes de lazer”, sem que sejam observadas as disposições da Lei nº 6.766/79:
Manifesta a inconstitucionalidade de lei local, tentando contornar o regramento da Lei Federal nº 6.766/79, apresenta-se inquestionável a irregularidade de verdadeiros condomínios, mascarados como “Clubes de Lazer”, cumprindo ao loteador promover sua regularização, inexistente qualquer prescrição (ante a permanência da situação ilícita), o que, no caso do “Condomínio Ferradura”, por localizado em área urbana, apresenta-se perfeitamente viável, notadamente pela aplicação das providências constantes do Provimento nº 28/04, Corregedoria-Geral da Justiça, a arredar qualquer impossibilidade jurídica, legitimado o Ministério Público a propor ação civil pública em defesa ao meio ambiente e ordem urbanística. (Apelação Cível Nº 70043969872, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Armínio José Abreu Lima da Rosa, Julgado em 11/07/2012)
Associação
Outra opção ilegal de ocupação do solo é através da abertura de uma associação, no qual o proprietário da gleba vende ela para a associação, que, por sua vez, vende a gleba para diversos interessados, denominados de associados, para que a ocupem com fins habitacionais. Difere do clube de lazer, pois enquanto neste visa a abertura de uma empresa destinada a recreação e lazer, na associação a única finalidade é ocupar a gleba para a moradia dos associados. É mais um meio esdrúxulo de ocupação do solo, em absoluta violação e desprezo a legislação de regência sobre o tema, que é a Lei nº 6.766/79, que não admite a alienação de lotes sem aprovação e registro no Cartório de Imóveis, inclusive tipificando tal conduta como crime qualificado contra a Administração Pública[4].
Condomínio em multipropriedade
Segundo o artigo 1.358-C, do Código Civil, “multipropriedade é o regime de condomínio em que cada um dos proprietários de um mesmo imóvel é titular de uma fração de tempo, à qual corresponde a faculdade de uso e gozo, com exclusividade, da totalidade do imóvel, a ser exercida pelos proprietários de forma alternada”.
O sistema time sharing ou multipropriedade imobiliária é uma espécie condominial relativa aos locais de lazer, pela qual há um aproveitamento econômico de bem imóvel (casa, chalé, apartamento), repartido, como ensina Gustavo Tepedino, em unidades fixas de tempo, assegurando a cada cotitular o seu uso exclusivo e perpétuo durante certo período anual (mensal, quinzenal ou semanal). Possibilita o uso do imóvel (casa, apartamento, flat, chalé) em certos períodos ou temporadas, variando o preço conforme o tempo de sua utilização e temporada (baixa, média ou alta). Trata-se de uma multipropriedade periódica, muito útil para desenvolvimento de turismo em hotéis, clubes e em navios. Há um direito real de habitação periódica, como dizem os portugueses, democratizando o imóvel de férias, cujo administrador (trustee) o mantém em nome de um clube, concedendo e organizando o seu uso periódico. Todos os adquirentes são comproprietários de fração ideal, sofrendo limitações temporais e condominiais, sendo que a relação de tempo repartido fica estabelecida e, regulamento. A Argentina e a Venezuela referem-se a ela como sendo uma propriedade de tempo compartilhado e os italianos consideram-na uma proprietà spazio temporale.
Mas não visa tão somente o uso de imóvel em certa área turística, pois pode envolver troca de uso dos direitos habitacionais ao local de férias, direitos condominiais, participação em sociedade com direito a ações, direitos pessoais quanto a serviços ligados a utilização do imóvel, como os de hotelaria.
O condomínio em multipropriedade quando for constituído na forma de condomínio de casas e lotes, formando uma divisão de lotes, com arruamento, extrapolando os limites da quadra, apresentando as características próprias do parcelamento do solo, deve igualmente cumprir a legislação urbanística federal (Lei nº 6.766/79), bem como a regulamentação municipal.
[1] Formado em Direito pela Universidade Federal Fluminense, foi Senador da República pelo Estado de São Paulo de 1976 a 1979, tornando-se muito conhecido e admirado em função da Emenda Lehmann, ponto polêmico na época, que obrigou nos processos de alienação do controle das sociedades anônimas a oferta pública aos acionistas minoritários. Ainda foi Presidente do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo. Faleceu aos 95 anos em 2010.
[2] As Ordenações Filipinas ou Código Filipino foi uma compilação de normas jurídicas, de 1595, revogando o Código Manuelino, durante o domínio espanhol em Portugal, implementada no reinado de Filipe II da Espanha.
[3] Gasparini, Diógenes. O Município e o Parcelamento do Solo. São Paulo: Editora Saraiva.
[4] Lei nº 6.766/79: Art. 50. Constitui crime contra a Administração Pública. I – dar início, de qualquer modo, ou efetuar loteamento ou desmembramento do solo para fins urbanos, sem autorização do órgão público competente, ou em desacordo com as disposições desta Lei ou das normas pertinentes do Distrito Federal, Estados e Municipíos; II – dar início, de qualquer modo, ou efetuar loteamento ou desmembramento do solo para fins urbanos sem observância das determinações constantes do ato administrativo de licença; III – fazer ou veicular em proposta, contrato, prospecto ou comunicação ao público ou a interessados, afirmação falsa sobre a legalidade de loteamento ou desmembramento do solo para fins urbanos, ou ocultar fraudulentamente fato a ele relativo. Pena: Reclusão, de 1(um) a 4 (quatro) anos, e multa de 5 (cinco) a 50 (cinqüenta) vezes o maior salário mínimo vigente no País.
Parágrafo único – O crime definido neste artigo é qualificado, se cometido. I – por meio de venda, promessa de venda, reserva de lote ou quaisquer outros instrumentos que manifestem a intenção de vender lote em loteamento ou desmembramento não registrado no Registro de Imóveis competente. II – com inexistência de título legítimo de propriedade do imóvel loteado ou desmembrado, ressalvado o disposto no art. 18, §§ 4º e 5º, desta Lei, ou com omissão fraudulenta de fato a ele relativo, se o fato não constituir crime mais grave. (Redação dada pela Lei nº 9.785, de 1999) Pena: Reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, e multa de 10 (dez) a 100 (cem) vezes o maior salário mínimo vigente no País.
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