Conceito
Disse Hely Lopes Meirelles que toda cidade há que ser planejada: a cidade nova, para sua formação; a cidade implantada, para sua expansão; a cidade velha, para sua renovação. Mas não só o perímetro urbano exige planejamento, como também as áreas de expansão urbana e seus arredores, para que a cidade não venha a ser prejudicada no seu desenvolvimento e na sua funcionalidade pelos futuros núcleos urbanos que tendem a se formar em sua periferia[1].
Ainda segundo Hely Lopes Meirelles, o plano diretor é o complexo de normas legais e diretrizes técnicas para o desenvolvimento global e constante do Município, sob os aspectos físico, social, econômico e administrativo, desejado pela comunidade local. Deve ser a expressão das aspirações dos munícipes quanto ao progresso do território municipal no seu conjunto cidade/campo. É o instrumento técnico-legal definidor dos objetivos de cada Municipalidade, e por isso mesmo com supremacia sobre os outros, para orientar toda atividade da Administração e dos administrados nas realizações públicas e particulares que interessem ou afetem a coletividade[2].
Toshio Mukai conceitua plano diretor como o instrumento legal que visa propiciar o desenvolvimento urbano (portanto, da cidade) do Município, fixando diretrizes objetivas (metas), programas ou projetos para tanto, em um horizonte de tempo determinado. Esses elementos do plano são voltados para os seguintes conteúdos, que ele deverá consignar e abranger: aspectos administrativo-financeiros, sociais, econômicos, urbanísticos (de ordenação do território, por meio da disciplina dos usos, ocupações, parcelamentos e zoneamento do solo urbano) e ambientais[3].
Para Celso Antonio Pacheco Fiorillo, o plano diretor, conforme clara determinação constitucional (art. 182, §1º, da Carta Magna), é o instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana no âmbito do meio ambiente artificial. A propriedade urbana cumprirá sua função social quando atender às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor (art. 182, §2º, da Constituição Federal) – logo, o regime da propriedade urbana passa a ter identidade jurídica com os preceitos estabelecidos em lei pelo denominado plano diretor. Referido instrumento constitucional, apontado no Estatuto da Cidade como instrumento de planejamento municipal (art. 4º, III, a), tem diretrizes, conteúdo e forma descritos em lei (arts. 2º, 39 a 42 do Estatuto da Cidade) e faz parte do denominado processo de planejamento municipal, devendo o plano plurianual, as diretrizes orçamentárias e o orçamento anual – leis de iniciativa do Poder Executivo previstas no art. 165 da Constituição Federal – incorporar as diretrizes e prioridades nele contidas (art. 40, §1º, do Estatuto da Cidade)[4].
Hely Lopes Meirelles ensina que o plano diretor não é estático, é dinâmico e evolutivo. Na fixação dos objetivos e na orientação do desenvolvimento do Município é a lei suprema e geral que estabelece as prioridades nas realizações do governo local, conduz e ordena o crescimento da cidade, disciplina e controla as atividades urbanas em benefício do bem-estar social.
O plano diretor não é um projeto executivo de obras e serviços públicos, mas sim um instrumento norteador dos futuros empreendimentos da Prefeitura, para o racional e satisfatório atendimento das necessidades da comunidade. Por isso não exige plantas, memoriais e especificações detalhadas, pedindo apenas indicações precisas do que a Administração Municipal pretende realizar, com a localização aproximada e as características estruturais ou operacionais que permitam, nas épocas próprias, a elaboração dos projetos executivos com a estimativa dos custos das respectivas obras, serviços ou atividades que vão compor os empreendimentos anteriormente planejados, sejam construções isoladas, sejam planos setoriais de urbanização ou de reurbanização, sejam sistemas viários, redes de água e esgoto, ou qualquer outro equipamento público ou de interesse social.
Enquanto o plano diretor é sempre uno e integral, os planos de urbanização ou de reurbanização geralmente são múltiplos e setoriais, pois visam a obras isoladas, ampliação de bairros (plano de expansão), formação de novos núcleos urbanos. (urbanização por loteamentos), renovação de áreas envelhecidas e tomadas impróprias para sua função (reurbanização) e quaisquer outros empreendimentos parciais, integrantes do plano geral. Estes procedimentos urbanísticos não se confundem com o plano diretor, pois, embora sigam suas diretrizes, passam a constituir atos autônomos e concretos de administração, e ainda que aprovados por lei, quando devam ser por decreto, se tornam passíveis de impugnação judicial se incidentes sobre a propriedade particular e lesivos de direito individual mesmo antes das medidas expropriatórias para ocupação do imóvel atingido[5].
Função social da propriedade
A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor, assegurando o atendimento das necessidades dos cidadãos quanto à qualidade de vida, à justiça social e ao desenvolvimento das atividades econômicas, respeitadas as diretrizes previstas no artigo 2º, do Estatuto da Cidade.
Numa primeira acepção, considerar-se-á que a ‘função social da propriedade’ consiste em que esta deve cumprir um destino economicamente útil, produtivo, de maneira a satisfazer as necessidades sociais preenchíveis pela espécie tipológica do bem (ou pelo menos não poderá ser utilizada de modo a contraditar estes interesses), cumprindo, destarte, às completas, sua vocação natural, de molde a canalizar as potencial idades residentes no bem em proveito da coletividade (ou, pelo menos, não poderá ser utilizada de modo a adversá-Ias). Função social da propriedade é tomada como necessidade de que o uso da propriedade responda a uma plena utilização, otimizando-se ou tendendo-se a otimizar os recursos disponíveis em mãos dos proprietários ou, então, impondo-se que as propriedades em geral não possam ser usadas, gozadas e suscetíveis de disposição em contradita com estes mesmos propósitos de proveito coletivo. À expressão ‘função social da propriedade’ pode-se também atribuir outro conteúdo, vinculado a objetivos de justiça social; vale dizer, comprometido com o projeto de uma sociedade mais igualitária ou menos desequilibrada – como é o caso do Brasil- no qual o acesso à propriedade e o uso dela sejam orientados no sentido de proporcionar ampliação de oportunidades a todos os cidadãos independentemente da utilização produtiva que porventura já esteja tendo[6].
Território de influência do plano diretor
Deverá englobar o território do Município como um todo, conforme prescreve o artigo 40, §2º do Estatuto da Cidade. Há quem afirme que o plano diretor somente deve abranger a área urbana da cidade, pois os instrumentos de política previstos no Estatuto da Cidade somente poderiam ser aplicados com os fins de urbanização. Ademais, o artigo 30, VIII, da Constituição Federal estabelece que cabe ao Município promover o adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo “urbano”. O artigo 182, da Constituição Federal, por sua vez, estabelece que a política de desenvolvimento “urbano” é executada pelo Poder Público municipal.
Acontece que o Estatuto da Cidade adota regra oposta, ao determinar que o plano diretor abrange todo o território do Município, seja essa área urbana ou rural, indistintamente. Conforme defende Jacinto Arruda câmara, professor de Direito da PUC/SP, a regra há de ser bem compreendida.
Obrigatoriedade de Plano Diretor
O artigo 182, §1º da Constituição Federal determina que o plano diretor é obrigatório para cidades com mais de vinte mil habitantes. Ocorre que o Estatuto da Cidade ampliou a obrigatoriedade do plano diretor e fez isso dentro da competência legislativa da União sobre Direito Urbanístico (artigo 24, I, Constituição Federal). Assim, pelo artigo 41, do Estatuto da Cidade, o plano diretor é obrigatório para cidades:
I – com mais de vinte mil habitantes
Essa informação será obtida através do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE de acordo com o último censo realizado (em 2010). Para fins de obrigatoriedade do plano diretor a população “estimada” não é um fator de obrigatoriedade, mas apenas um alerta para o Administrador Público dar início as ações governamentais para elaborar um plano diretor.
II – integrantes de regiões metropolitanas e aglomerações urbanas
Região metropolitana é a unidade regional instituída pelos Estados, mediante lei complementar, constituída por agrupamento de Municípios limítrofes para integrar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum (artigo 2º, VII, Lei nº 13.089/15). Aglomeração urbana e a unidade territorial urbana constituída pelo agrupamento de 2 (dois) ou mais Municípios limítrofes, caracterizada por complementaridade funcional e integração das dinâmicas geográficas, ambientais, políticas e socioeconômicas (artigo 2º, I, Lei nº 13.089/15).
III – onde o Poder Público municipal pretenda utilizar os instrumentos previstos no § 4º do art. 182 da Constituição Federal
Se por questão de política urbana o Município, possuindo menos de vinte mil habitantes e não se enquadrando em nenhuma das hipóteses que tornam obrigatório o plano diretor, pode ser que tenha interesse em instituir o “parcelamento, edificação e utilização compulsórios”, que além de previsto no §4º do artigo 182 da Constituição Federal é regulamentado pelo artigo 5º do Estatuto da Cidade. Entretanto, é importante consignar que outros institutos jurídicos também exigem um plano diretor para que sejam adotados, assim é com o direito de preempção (artigo 25, Estatuto da Cidade), a outorga onerosa do direito de construir (artigo 28, Estatuto da Cidade), a operação urbana consorciada (artigo 32, Estatuto da Cidade) e a transferência do direito de construir (artigo 35, Estatuto da Cidade).
IV – integrantes de áreas de especial interesse turístico
Áreas Especiais de Interesse Turístico são trechos contínuos do território nacional, inclusive suas águas territoriais, a serem preservados e valorizados no sentido cultural e natural, e destinados à realização de planos e projetos de desenvolvimento turístico. As Áreas Especiais de Interesse Turístico serão instituídas por decreto do Poder Executivo, mediante proposta da Confederação Nacional do Turismo, para fins de elaboração e execução de planos e programas destinados a: I – promover o desenvolvimento turístico; II – assegurar a preservação e valorização do patrimônio cultural e natural; III – estabelecer normas de uso e ocupação do solo; IV – orientar a alocação de recursos e incentivos necessários a atender aos objetivos e diretrizes da presente Lei. As Áreas Especiais de Interesse Turístico estão previstas e regulamentadas na Lei nº 6.513/77 e no Decreto nº 88.176/81. Entretanto, essas áreas nunca foram criadas. Elas, na prática, não existem.
V – inseridas na área de influência de empreendimentos ou atividades com significativo impacto ambiental de âmbito regional ou nacional
Estabelece o artigo 225 da Constituição Federal que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”. Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade. Este estudo técnico deve demonstrar o âmbito de impacto do empreendimento ou atividade. Estando o Município em área de influência deles será obrigatória a elaboração do plano diretor, para que este estabeleça uma política urbanística e ambiental adequada a esses impactos. Os recursos técnicos e financeiros para a elaboração do plano diretor estarão inseridos entre as medidas de compensação adotadas para o licenciamento do empreendimento ou atividade.
VI – incluídas no cadastro nacional de Municípios com áreas suscetíveis à ocorrência de deslizamentos de grande impacto, inundações bruscas ou processos geológicos ou hidrológicos correlatos
A Política Nacional de Proteção e Defesa Civil, instituída pela Lei nº 12.608/12, exige que a União institua e mantenha cadastro nacional de municípios com áreas suscetíveis à ocorrência de deslizamentos de grande impacto, inundações bruscas ou processos geológicos ou hidrológicos correlatos. Para os Municípios incluídos nesse cadastro de “áreas de risco” é obrigatória a elaboração de plano diretor. No seu artigo 23, consta que é vedada a concessão de licença ou alvará de construção em áreas de risco indicadas como não edificáveis no plano diretor ou legislação dele derivada. Já a Lei nº 6.766/79, com as alterações introduzidas pela citada lei de defesa civil, “nos Municípios inseridos no cadastro nacional de municípios com áreas suscetíveis à ocorrência de deslizamentos de grande impacto, inundações bruscas ou processos geológicos ou hidrológicos correlatos, a aprovação do projeto de que trata o caput ficará vinculada ao atendimento dos requisitos constantes da carta geotécnica de aptidão à urbanização”. E “é vedada a aprovação de projeto de loteamento e desmembramento em áreas de risco definidas como não edificáveis, no plano diretor ou em legislação dele derivada”.
A União ainda não criou o referido cadastro, embora fosse uma obrigação legal. Desse modo, nossa orientação é que, para preservar as diretrizes da Política Nacional de Defesa Civil, possuindo o Município áreas de risco, deve, obrigatoriamente, elaborar seu plano diretor com diretrizes para prevenção e mitigação dos riscos. Não importa o cadastro nacional não existir, pois a identificação e o mapeamento de áreas não habitáveis no Município demanda cautelas no ordenamento territorial e planejamento do solo.
Improbidade administrativa
Incorre em ato de improbidade administrativa o Prefeito que deixar de elaborar o plano diretor, revisá-lo ou nele deixar de incluir os instrumentos de política urbana que são obrigatórios (artigo 52, Estatuto da Cidade).
Plano de transporte urbano integrado:
No caso de cidades com mais de quinhentos mil habitantes, deverá ser elaborado um plano de transporte urbano integrado, compatível com o plano diretor ou nele inserido (artigo 41, §2º, Estatuto da Cidade).
Plano de rotas acessíveis:
Os Municípios incluídos no rol daqueles obrigados a ter um plano diretor, devem elaborar plano de rotas acessíveis, compatível com o plano diretor no qual está inserido, que disponha sobre os passeios públicos a serem implantados ou reformados pelo poder público, com vistas a garantir acessibilidade da pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida a todas as rotas e vias existentes, inclusive as que concentrem os focos geradores de maior circulação de pedestres, como os órgãos públicos e os locais de prestação de serviços públicos e privados de saúde, educação, assistência social, esporte, cultura, correios e telégrafos, bancos, entre outros, sempre que possível de maneira integrada com os sistemas de transporte coletivo de passageiros (artigo 41, §3º, Estatuto da Cidade).
Conteúdo mínimo do Plano Diretor
Segundo o artigo 42 do Estatuto da Cidade, o plano diretor deverá conter no mínimo os seguintes elementos:
I – a delimitação das áreas urbanas onde poderá ser aplicado o parcelamento, edificação ou utilização compulsórios, considerando a existência de infra-estrutura e de demanda para utilização, na forma do art. 5º desta Lei
O legislador impõe como obrigatório o instituto jurídico do “parcelamento, edificação ou utilização compulsórios”, previsto no artigo 182, §4º, da Constituição Federal e no artigo 5º do Estatuto da Cidade. Coloca-se esse instituto jurídico como um mecanismo de importante ação para o desenvolvimento urbano da cidade. Exigir que se parcele, edifique ou utilize o imóvel não edificado, subutilizado ou não utilizado promove a ocupação da cidade de forma planejada e eficiente. A cidade em transformação, evitando áreas degradadas, abandonadas e dando a certos espaços uma destinação de interesse público. O instituto se completa com o imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo e a desapropriação com pagamento em títulos da dívida pública.
II – disposições requeridas pelos arts. 25, 28, 29, 32 e 35 desta Lei
O direito de preempção (artigo 25, Estatuto da Cidade), a outorga onerosa do direito de construir (artigo 28, Estatuto da Cidade), a alteração do uso do solo (artigo 29, Estatuto da Cidade), a operação urbana consorciada (artigo 32, Estatuto da Cidade) e a transferência do direito de construir (artigo 35, Estatuto da Cidade) são institutos jurídicos que obrigatoriamente devem constar do plano diretor.
III – sistema de acompanhamento e controle
A principal virtude de qualquer plano está na sua exequibilidade e viabilidade. Um plano que não seja exequível é pior que a falta de plano, porque gera custos sem resultados. A execução material do plano diretor efetiva-se através da aplicação da respectiva lei, o que pode exigir a expedição de leis especiais, de regulamentos previstos ou necessários, bem como de planos executivos, planos especiais e planos parciais, nele exigidos. Os instrumentos de execução, segundo Spantigatti, são de duas categorias – os que entendem com mecanismos de controle e os que entendem com mecanismos de substituição – e dão origem a quatro tipos: controle por parte do Poder Público e controle por parte dos particulares; substituição de titularidade nas atribuições dos Poderes Públicos e substituição de titularidade nos direitos privados. A licença de obras e o “habite-se” são os instrumentos de controle público mais importantes, porque impedem a construção e o uso de imóveis em contraste com as determinações do plano. A licença de obras e o “habite-se” são os instrumentos de controle público mais importantes, porque impedem a construção e o uso de imóveis em contraste com as determinações do plano.
Áreas de risco
De acordo com o artigo 42-A, do Estatuto da Cidade, incluído pela Lei nº 12.608/12 (Política Nacional de Proteção e Defesa Civil) o plano diretor dos Municípios incluídos no “cadastro nacional de municípios com áreas suscetíveis à ocorrência de deslizamentos de grande impacto, inundações bruscas ou processos geológicos ou hidrológicos correlatos” deverá conter elementos específicos.
O cadastro nacional não foi criado ainda pela União, mas isso não impede a presença de diretrizes e normas que previnam ou mitiguem esses riscos.
O mais prudente é os Municípios que possuam áreas de risco, providenciar plano diretor com o conteúdo especial indicado pelo artigo 42-A:
I – parâmetros de parcelamento, uso e ocupação do solo, de modo a promover a diversidade de usos e a contribuir para a geração de emprego e renda
Deverá o plano diretor conter normas gerais regulamentando a aplicação da Lei nº 6.766/79 (Lei de Parcelamento do Solo Urbano), bem como as figuras do loteamento, desmembramento e, se assim o desejar por motivo de política urbana, os condomínios de casas e de lotes. Isso é o que chamamos de parcelamento do solo. Mas não é só isso. O legislador refere a “parcelamento”, mas também “uso” e “ocupação” do solo. O uso do solo significa que o plano diretor precisa conter parâmetros de zoneamento, com finalidades residenciais, comerciais, institucionais, já que o legislador propõe a diversidade de usos como meio de geração de empregos e renda. Já em relação a ocupação, são parâmetros o aproveitamento do lote em si, com a sua ocupação. Definir, por exemplo, a taxa de ocupação para cada zona ou macrozona da cidade é também um critério obrigatório pela norma exigência legal.
II – mapeamento contendo as áreas suscetíveis à ocorrência de deslizamentos de grande impacto, inundações bruscas ou processos geológicos ou hidrológicos correlatos
O plano diretor deve conter um mapa com a indicação de todas as áreas suscetíveis a deslizamentos de grande impacto, inundações bruscas ou processos geológicos ou hidrológicos críticos.
III – planejamento de ações de intervenção preventiva e realocação de população de áreas de risco de desastre
Diante do mapeamento das áreas de risco o plano diretor deverá trazer medidas para a intervenção preventiva nessas áreas ou a retirada das famílias do local e reassentamento em outras áreas, conforme critérios de interesse social a serem avaliados. Se determinado bairro está em uma área de enchentes, provocada pela várzea de um rio, a Administração deverá constar do plano diretor quais medidas efetivamente serão adotadas, se a execução de obras de infraestrutura ou a remoção das famílias.
IV – medidas de drenagem urbana necessárias à prevenção e à mitigação de impactos de desastres
Ao adotar a palavra “medidas” o legislador vai muito além do planejamento ou diretrizes, pois aqui exige ações de efeito concreto. A drenagem urbana é fundamental para evitar os impactos provocados por grandes enchentes e cheias de rios.
V – diretrizes para a regularização fundiária de assentamentos urbanos irregulares, se houver, observadas a Lei nº 11.977/09 e demais normas federais e estaduais pertinentes, e previsão de áreas para habitação de interesse social por meio da demarcação de zonas especiais de interesse social e de outros instrumentos de política urbana, onde o uso habitacional for permitido
Embora o Estatuto da Cidade refira-se a Lei nº 11.977/09, a verdade é que todo o capítulo referente a regularização fundiária urbana foi revogado pela Lei nº 13.465/17, que instituiu a regularização fundiária urbana (Reurb) de “núcleos urbanos informais consolidados”. Pelo que estabelece o Estatuto da Cidade, as diretrizes de regularização fundiária precisam constar do plano diretor dos Municípios inseridos no cadastro nacional de áreas de risco. Evidente que essas diretrizes devem estar compatíveis com o disposto na Lei nº 13.465/17, já que a competência para legislar sobre Direito Urbanístico é da União (artigo 24, I, Constituição Federal), competindo aos Municípios suplementar essa legislação nos assuntos de interesse local, especialmente para promover o adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano (artigo 30, I, II e VIII, Constituição Federal).
VI – identificação e diretrizes para a preservação e ocupação das áreas verdes municipais, quando for o caso, com vistas à redução da impermeabilização das cidades
Nos termos do conceito introduzido pela Lei nº 12.651/12 (Código Florestal), área verde urbana são os espaços, públicos ou privados, com predomínio de vegetação, preferencialmente nativa, natural ou recuperada, previstos no Plano Diretor, nas Leis de Zoneamento Urbano e Uso do Solo do Município, indisponíveis para construção de moradias, destinados aos propósitos de recreação, lazer, melhoria da qualidade ambiental urbana, proteção dos recursos hídricos, manutenção ou melhoria paisagística, proteção de bens e manifestações culturais. O plano diretor precisa obrigatoriamente identificar as áreas verdes existentes, mapeando-as e estabelecendo diretrizes para sua proteção, com a principal finalidade de reduzir a impermeabilização do solo.
Conteúdo técnico-científico
Independentemente do que consta do artigo 42 e do artigo 42-A, do Estatuto da Cidade, o plano diretor, pela doutrina clássica é o instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana, que precisa conter normas que regulem as posturas municipais, estabelecendo as limitações administrativas, mas também diretrizes que promovam o desenvolvimento sob os aspectos físico, social, econômico e administrativo:
a) as normas de planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano; e
b) a indicação dos equipamentos públicos de infraestrutura urbana e os equipamentos comunitários a serem futuramente executados, indicando a localização, o momento ou o tempo em que serão executados e as características e diretrizes técnicas desses equipamentos públicos.
Lei municipal
Exige o artigo 40, do Estatuto da Cidade, que o plano diretor seja aprovado por lei municipal. O define como o instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana. O plano diretor é parte integrante do processo de planejamento municipal, devendo o plano plurianual, as diretrizes orçamentárias e o orçamento anual incorporar as diretrizes e as prioridades nele contidas.
Com efeito, entre os instrumentos que integram a elaboração do plano diretor encontra-se o projeto de lei a ser submetido à Câmara Municipal, para sua aprovação. A iniciativa dessa lei pertence ao Prefeito, sob cuja orientação se prepara o plano. O processo de elaboração dessa lei segue as regras do processo legislativo estabelecido na lei orgânica dos Municípios, mas aqui também se há de garantir aquela participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade (Estatuto da Cidade, art. 40, § 4º).
Para Hely Lopes Meirelles, a aprovação do plano diretor deve ser por lei, e lei com supremacia sobre as demais, para dar preeminência e maior estabilidade às regras e diretrizes do planejamento. Daí por que os Municípios podem estabelecer em sua legislação quórum qualificado para aprovação ou modificação da lei do plano diretor, infundindo, assim, mais segurança e perenidade a essa legislação. Toda cautela que vise a resguardar o plano diretor de levianas e impensadas modificações é aconselhável, podendo a própria Câmara estabelecer regimentalmente um procedimento especial, com maior número de’ discussões ou votação em duas ou mais sessões legislativas, para evitar a aprovação inicial e suas alterações por maiorias ocasionais[7].
Apresentado o projeto à Câmara, com todos os documentos do plano, o Presidente desta o remeterá às comissões competentes, para estudo e parecer. Não há proibição de emendas. Claro também que o projeto do plano diretor pode ser aprovado, com ou sem emendas, ou rejeitado. Não é, porém, de boa prática rejeitá-lo in totem, a não ser que os estudos técnicos revelem sua absoluta inaceitabilidade, sua inexequibilidade ou sua inviabilidade econômica, e não haja meio de aperfeiçoá-lo.
Se o plano deixar algo a desejar, importa aos Vereadores procurar seu aperfeiçoamento, antes que sacrificá-lo de vez. Aperfeiçoar os projetos é missão do legislador, mormente quando contêm instrumento tão importante para o crescimento e desenvolvimento ordenado da comunidade. Rejeitá-Ios, pura e simplesmente, se é uma faculdade do Legislativo, nem sempre se revela uma medida satisfatória e conveniente. Por outro lado, devem ser evitadas emendas que o desfigurem, lhe quebrem a coerência ou o tomem inexequível, ou de mera satisfação de interesse individual ou em detrimento do interesse público.
O conteúdo da lei do plano corresponde, em princípio, ao conteúdo do próprio plano. Cuidará da fixação dos objetivos e diretrizes básicas. Estabelecerá as normas ordenadoras e disciplinadoras pertinentes ao planejamento territorial. Definirá as áreas urbanas, urbanizáveis e de expansão urbana. Disporá sobre a ordenação do solo, estabelecendo as regras fundamentais do uso do solo, incluindo o parcelamento, o zoneamento, o sistema de circulação – enfim, sobre aqueles três sistemas antes indicados: sistema viário, sistema de zoneamento e sistema de lazer e recreação.
Tais normas já podem conter em si todos os elementos para sua eficácia e aplicação imediata, com o quê os efeitos do plano se manifestarão diretamente vinculantes para os órgãos públicos e para os particulares. Mas em alguns casos a lei do plano pode deixar certas disposições para atuação ulterior, mediante leis especiais – por exemplo, sobre uso do solo, edificações. Pode também estabelecer as normas fundamentais (as diretrizes), remetendo a regulamento os pormenores de sua aplicação, como é comum verificar-se no que tange às normas de zoneamento.
O plano diretor pode ser apenas geral, ficando sua atuação dependendo de planos especiais, setoriais e plano executivo. Mas é certo que a lei do plano é eficaz nos limites de suas determinações, importando efeitos desde logo vinculantes para os órgãos públicos e para os particulares, que ficam sujeitos às suas normas. Assim, são nulos os atos municipais contrários às normas do plano. As limitações à propriedade privada operam imediatamente, quer quanto às obrigações de não-fazer, como a regra non aedificandi, referentes às áreas declaradas não-edificáveis, quer quanto às obrigações de fazer, como a definição de área em que o Poder Público Municipal, mediante lei específica, poderá exigir, nos termos de lei federal, que o proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado promova seu adequado aproveitamento, sob pena de parcelamento ou edificação compulsórios (Constituição Federal, art. 182, § 4º).
A eficácia da lei do plano só opera, evidentemente, a partir de sua entrada em vigor, circunstância que se materializa com a publicação da lei, observado o artigo 1º, da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro[8].
Revisão do plano diretor
A lei que instituir o plano diretor deverá ser revista, pelo menos, a cada dez anos, conforme o artigo 40, §3º, do Estatuto da Cidade. O descumprimento disso está tipificado como ato de improbidade administrativa do Prefeito (artigo 52, VII, Estatuto da Cidade).
Processo de elaboração e de implementação do plano diretor
O plano diretor, em seu aspecto técnico, é um documento de base que se apresenta sob a forma gráfica, compreendendo relatório, mapas e quadros, que consubstanciam o retrato da situação existente e as projeções da situação futura, transformada. A formulação desse documento é uma tarefa técnica multidisciplinar. Embora predominem, aqui, os aspectos técnicos, revela-se ainda como um procedimento jurídico, dadas as exigências legais que impõem a ele a observância de determinadas regras de conduta.
No processo de elaboração e revisão, analisaremos a seguir os seguintes aspectos: 1) plano diretor participativo; 2) etapas na elaboração do plano diretor; 3) metodologia na elaboração.
[1] Hely Lopes Meirelles. Direito Municipal Brasileiro. Pág. 538.
[2] Hely Lopes Meirelles. Direito Municipal Brasileiro. Pág. 538.
[3] Toshio Mukai. O Estatuto da Cidade. Pág. 51.
[4] Celso Antonio Pacheco Fiorillo e Renata Marques Ferreira. Estatuto da Cidade Comentado. Pág. 182/183.
[5] Hely Lopes Meireles. Direito Municipal Brasileiro. Urbanismo e Proteção Ambiental. Plano Diretor do Município. Editora Malheiros.
[6] Adilson Abreu Dallari. Pág. 76/77.
[7] Hely Lopes Meirelles. Direito Municipal Brasileiro. Pág. 540.
[8] Art. 1º Salvo disposição contrária, a lei começa a vigorar em todo o país quarenta e cinco dias depois de oficialmente publicada.
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